Nesta série de artigos serão abordados conceitos da síntese sonora, os processos de geração de sons existentes, as estruturas mais usadas nos sintetizadores e seus elementos e parâmetros, além de referências práticas
A tecnologia está presente na música desde o surgimento dos instrumentos mais primitivos, que, muito provavelmente, eram de percussão. Acompanhando a evolução tecnológica da humanidade, foram surgindo inúmeras maneiras de produzir e controlar o som, praticamente a partir de tudo o que podia vibrar e ser ouvido. Usando tubos, cordas, membranas e caixas de ressonância, os recursos foram se tornando cada vez mais complexos. Também foram se sofisticando as técnicas utilizadas na construção dos instrumentos, a partir da apropriação dos crescentes conhecimentos da matemática, da física e da ciência dos materiais, proporcionando melhor qualidade sonora, mais expressividade, maior durabilidade e constante adequação ergonômica para um uso mais conveniente.
À medida que os instrumentos musicais foram evoluindo e ficando mais expressivos, as técnicas para obter um melhor resultado com eles também foram se aprimorando. Por exemplo, para que se possa conseguir o melhor desempenho de um violino, obviamente é preciso saber tocá-lo, porém, muito mais do que isso, é preciso saber tocá-lo muito bem. A competência técnica para a execução perfeita do instrumento requer um pleno conhecimento do seu comportamento, além da habilidade e da destreza para dominá-lo.
Cada um dos instrumentos musicais convencionais tem as suas particularidades em termos de timbre, dinâmica, possibilidades de controle e de expressividade. De maneira geral, essas características estão diretamente associada aos aspectos construtivos do instrumento e às características específicas dos materiais com os quais ele é construído (é isso que diferencia um oboé de uma flauta, por exemplo). E são esses mesmos fatores que também estabelecem limitações a cada um dos instrumentos acústicos convencionais. No violino, por exemplo, o músico pode ficar sustentando uma nota indefinidamente, o que no piano é impossível. A busca por novos timbres e por outros meios de expressividade na música é algo que acontece desde sempre, e é por isso que existe uma variedade de instrumentos acústicos, resultado de uma evolução constante ao longo da história, sempre apoiada nos desenvolvimentos técnicos e científicos.
A relação entre a música e a tecnologia no decorrer da história é bastante intensa, de tal maneira que, assim como as inovações tecnológicas proporcionam o desencadeamento de novas formas de manifestação artística, também a tecnologia aplicada à música vai se ajustando aos novos padrões artísticos de cada época.
As grandes transformações da humanidade ocorridas a partir da segunda metade do século 19, com a expansão industrial e a proliferação das máquinas e seus ruídos, suscitaram ideias inovadoras também na música. Um exemplo são as obras de Luigi Russolo, do movimento futurista italiano no início dos anos 1900, que utilizava os Intonarumore, instrumentos acústicos que produziam diferentes tipos de ruídos. Na mesma época, também a música executada em instrumentos convencionais ganhava novos rumos, com artistas de vanguarda rejeitando as regras universais de melodia, harmonia e ritmo.
A chegada do século 20 e a síntese sonora
Com o surgimento da eletrônica, no começo do século 20, começaram a ser desenvolvidos instrumentos musicais bastante inovadores, marcando o início de uma nova era, em que o som não precisa mais ser gerado a partir da vibração de elementos mecânicos.
Começava a ser definido um novo conceito de instrumento musical, cuja resposta à ação do músico se dá de forma bem diferente do que ocorre nos instrumentos acústicos. Um exemplo bastante simbólico disso é o theremin, um aparelho desenvolvido na década de 1920 pelo russo Lev Termen, que não requer contato físico para produzir sons, mas apenas aproximar ou afastar as mãos de suas antenas.
Nas primeiras décadas do século 20, houve algumas iniciativas para o desenvolvimento de novos tipos de instrumentos musicais, porém foram poucas as que de fato deram certo, como é o caso do órgão elétrico, aperfeiçoado pelo norte-americano Laurens Hammond, na década de 1930.
O surgimento do transistor e o enorme excedente de componentes eletrônicos após a 2a Guerra Mundial proporcionaram uma expansão sem precedentes da indústria eletrônica. A nova era de relativa paz e crescente prosperidade no mundo ocidental também foi palco para o nascimento de formas igualmente novas de manifestações artísticas, dentre elas uma vertente musical nascida, principalmente, em estúdios experimentais na França (Musique Concrète) e na Alemanha (Elektronische Musik), e que assentou as bases para a música eletroacústica e os demais subgêneros de música eletrônica que existem atualmente.
Os recursos eletrônicos utilizados para a produção daquela modalidade de música não se caracterizavam exatamente como instrumentos musicais. O processo envolvia o uso de microfones, osciladores, moduladores e outros tipos de circuitos, e o material sonoro era registrado em fita magnética.
O sintetizador
Nas décadas de 1950 e 1960, as pesquisas para produção sonora por processos eletrônicos também ganharam muita força nos Estados Unidos, a ponto de a RCA, um grande conglomerado industrial e comercial nas áreas de entretenimento, investir mais de duzentos mil dólares na construção de um enorme laboratório (Columbia- Princeton Electronic Music Center) para o desenvolvimento de composição por processos eletrônicos. Surgia, então, a conceituação do que hoje se chama “sintetizador”, e as principais perspectivas para essa nova classe de instrumento eram a produção sonora para televisão e cinema, sobretudo para aplicações em sonoplastia e efeitos especiais. (Para ler a matéria completa de Miguel Ratton, clique aqui e acesse gratuitamente a edição 50 da revista digital Teclas & Afins.)
Miguel Ratton é engenheiro eletrônico e há quase trinta anos atua no segmento de tecnologia musical, realizando projetos de equipamentos e sistemas, e prestando consultoria técnica a empresas e estúdios. É também autor de vários livros sobre o assunto. Para saber mais, visite ratton.com.br e facebook.com/m.ratton.eng.tec
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